ATA NOTARIAL
Ata notarial. Procedimentos básicos da sua lavratura. Técnica
de redação – o coração desse precioso instrumento notarial.
Felipe Leonardo Rodrigues *
Ata notarial é o
instrumento público no qual a pedido de pessoa capaz o
tabelião formaliza um documento narrando fielmente tudo
aquilo que verifica com seus próprios sentidos sem
emissão de opinião, juízo de valor ou conclusão, ou
seja, narra e materializa os acontecimentos em sua
essência, constitui prova para ser utilizada quando
conveniente, de modo que a veracidade (juris tantum)
somente poderia ser retirada através de sentença
transitada em julgado.
Conceituamos a ata
notarial como: “Instrumento público no qual o tabelião
ou preposto autorizado, a pedido de pessoa capaz ou
representante legal, materializa fielmente em forma
narrativa o estado dos fatos e das coisas, de tudo
aquilo que verifica com seus próprios sentidos sem
emissão de opinião, juízo de valor ou conclusão,
portando por fé que tudo aquilo presenciado e relatado
representa a verdade, consignando-os em livro de notas”.
Na lavratura de qualquer das espécies de ata
notarial, o tabelião ou preposto autorizado poderá
seguir cinco procedimentos básicos para escrever a ata
notarial:
1º)
Quem (solicitante): é a denominação da pessoa que
solicita a ata notarial.
Pessoas que têm
legitimidade para solicitar:
a) pessoas capazes,
b) incapazes (maiores de dezesseis), c) procuradores e d)
pessoas jurídicas; se solicitação de incapaz, menção
expressa à idade e por quem assistido; se solicitação de
procurador, menção expressa à representação por
procurador, também menção à data, livro e folha do
cartório em que foi lavrada a procuração, e data da
expedição da certidão, quando exibida por essa forma; se
solicitação de pessoa jurídica, os documentos
comprobatórios da representação.
A nosso ver, o
instrumento particular de mandato é hábil para se fazer
representar na ata notarial, conforme item 12.1. da
seção II da lavratura dos atos notariais das Normas da
Corregedoria Geral de Justiça que diz ser vedado o uso
de instrumentos particulares de mandato ou
substabelecimentos, para lavratura de atos que exijam a escritura pública (art.
109 do Código Civil, grifo nosso).
Ademais, constará nome e
qualificação completa (nacionalidade, profissão, estado
civil, número do documento de identidade, repartição
expedidora, número de inscrição no cadastro de pessoas
físicas, domicílio e residência) do(s) solicitante(s),
assistente(s), procurador(es) ou representante(s).
As solicitações para verificação de fatos no
Tabelionato ou em diligência podem ser feitas por
qualquer tipo de comunicação (telefone, fax, e-mail) ou
pessoalmente. Frisamos: o solicitante na lavratura
estará pessoalmente e assinará perante o tabelião ou
preposto autorizado, qualificando-o e identificando-o.
2º) Quando - data / horas: constará a data e hora precisas da verificação dos fatos. Contudo, também constarão na ata notarial a data da lavratura para a devida leitura e assinatura, e as eventuais datas efetivas das verificações dos fatos, quando estes forem sucessivos. A nosso ver, é plenamente válida a verificação de fatos em dias anormais do expediente notarial, como aos sábados e domingos. Frisamos: Nesses casos, dependerá do entendimento do tabelião ou preposto autorizado, os quais verificarão se os fatos podem ser constatados em outro dia sem prejuízo do seu desaparecimento ou deverão ser naqueles dias (sábados ou domingos). Da mesma forma, a verificação dos fatos pelo tabelião ou preposto autorizado pode ser constatada a qualquer hora, inclusive naquelas antecedentes e supervenientes do expediente normal do Tabelionato. Salientamos que devem ser mencionados na ata notarial, a data, o dia da semana (quando sábado ou domingo) e as horas, evidenciando a verdadeira realidade dos fatos.
3º) Onde / local: Os fatos podem ser verificados no Tabelionato, como por exemplo, na verificação de fatos na Internet, onde o tabelião ou preposto autorizado acessará e verificará seu conteúdo em computador próprio. Grifamos pelo seguinte motivo: Atualmente, se o tabelião ou preposto autorizado não tiver habilidades em informática facilmente poderão ser induzidos a erro, pois ao acessarem e verificarem fatos na Internet em computadores de terceiros, poderão estar acessando páginas já armazenadas no computador (navegando em off line), ao invés de estarem conectados à Internet. Atualmente há programas que dão aparência às páginas off line ou armazenadas como se estivessem realmente na rede de comunicação de computadores Internet. Frisamos: cuidado para não fazer a verificação de fatos na Internet em máquinas de terceiros, exceto na verificação da existência de mensagens eletrônicas (e-mails). Nos fatos verificados em diligência, o tabelião ou preposto autorizado verificará sua competência territorial, conforme determina o artigo nono da lei 8.935/94 e nos lugares onde o acesso deve ser autorizado previamente, como por exemplo, a entrada na residência de determinada pessoa, no remanescente não há impedimentos.
4º)
O fato a ser descrito ou presenciado (objeto):
Geralmente as atas notariais - quanto ao objeto,
se classificam em: lícitos e ilícitos; físicos,
eletrônicos e sensoriais.
Fatos lícitos são
aqueles que não contrariam as leis, os contratos etc,
simplesmente fatos cotidianos, como por exemplo, a
materialização de um evento, a publicação de um livro ou
lançamento de um sítio.
Fatos ilícitos, como já
mencionamos em outras oportunidades, podem ser
verificados e descritos no instrumento em tela. O papel
primordial da ata notarial é materializar o fato e, se o
fato é ilícito, será transcrito como foi presenciado
pelo tabelião e, a toda evidência, não poderá contribuir
para propagar o fato ilícito. Entretanto, excluem-se os
crimes penais – tais como: homicídios, estelionatos,
lesões corporais etc. A nosso ver, a constatação e
materialização desses fatos são de competência exclusiva
da polícia judiciária, em especial do delegado de
polícia.
Fatos em meio físico são aqueles que
podem ser tocados, que não mudam constantemente, como
por exemplo, a verificação do estado de um imóvel.
Fatos em meio eletrônico são aqueles que, ao
contrário dos físicos, não podem ser tocados, são
aqueles que mudam constantemente, como por exemplo, a
verificação de uma notícia em determinado sítio na
Internet.
Fatos em meio sensorial são aqueles
por meio da visão, audição e olfato - onde o tabelião ou
preposto autorizado verifica com seus próprios sentidos,
como por exemplo, a verificação de um diálogo telefônico
em sistema viva-voz ou a verificação de substâncias
cheirosas, cujo odor incomoda determinadas pessoas.
5º) Por quê /
finalidade: esse procedimento se refere à
intenção do solicitante. Para que o tabelião ou preposto
autorizado possa informar se o êxito esperado é
consubstanciado em ata notarial ou escritura pública.
Vejamos a redação.
A técnica de redação
é imprescindível para lavratura da ata notarial. O
tabelião ou preposto autorizado redigirá a ata notarial
de forma imparcial, clara, concisa, coerente e
concomitantemente orientando o interessado sobre seus
aspectos, de modo a ensejar eficácia aos efeitos
almejados pelo solicitante, pois, nada logrará, se a
eficácia da ata for usurpada com vícios de redação.
Imparcialidade
Diz
respeito à não emissão de conclusões pessoais ou
favorecimento àquele que solicita a ata notarial.
Entretanto, o interessado pode solicitar ao tabelião que
mencione um determinado aspecto dentro dos fatos
verificados.
Citamos como ilustração - na
verificação do uso indevido de fotografias num
determinado sítio, o interessado solicita ao tabelião
que acesse o determinado endereço eletrônico (www) no
qual se verifique a publicação ou uso das fotografias.
Não obstante, o interessado também poderá solicitar ao
tabelião que verifique a ausência de indicação de
autoria das referidas fotografias, assim, corroborando o
uso indevido das mesmas.
Clareza
A clareza deve
ser a qualidade de todo texto notarial. Pode-se definir
como claro aquele texto que possibilita imediata
compreensão daquele que o lê. Entretanto, a clareza
também depende de outras características, tais como: o
uso do padrão culto de linguagem jurídica; evitar a
duplicidade de interpretações decorrentes da leitura do
texto etc;
Concisão
Conciso é o
texto que consegue transmitir um máximo de informações
com um mínimo de palavras. Não se deve entender a
concisão como economia de palavras ou pensamento. Para
que se redija com essa qualidade, é fundamental que se
tenha conhecimento do assunto sobre o qual se escreve.
Coerência
Construir períodos que expressem
pensamentos lógicos e coerentes.
Vejamos
sucintamente que a ata notarial se estende aos campos
processuais e extraprocessuais.
No campo
processual, com o crescimento populacional, a
desobediência às leis e aos contratos se multiplicou e a
prestação jurisdicional tornou-se morosa, tendo como
resultado um número enorme de processos judiciais à
espera de julgamentos. Como sabemos, a prova é o meio
com que as partes em litígio procuram firmar a convicção
do juiz, ao invés de perícias morosas e custosas, as
partes podem se valer da ata notarial, como meio prático
para celeridade dos processos.
No campo
extraprocessual, como a ata notarial pré-constitui
prova, ao invés de acionar a máquina judiciária em
primeiro plano, as partes litigiosas podem se valer da
ata notarial para acordos extrajudiciais, portanto,
prevenindo litígios e desonerando a colenda judiciária.
Parece-me ser essa a sua essência e o fator de sua
existência.
Vejamos as espécies.
Ata notarial -
objeto
1. Objeto: presença e declaração
Nessa ata o tabelião narrará fielmente
em linguagem jurídica a declaração do interessado. Essas
declarações são aquelas puras e simples que atingem
direitos próprios (sentido de se manifestar, fazer valer
o direito). Exemplo prático seria quando o consulado
exige o instrumento público (escrituras, atas notariais
e procurações) para satisfazer às exigências de
determinada norma interna. Nessa ata, a declaração
poderá ser absolutamente só ou em conjunto com
testemunhas.
2. Objeto: verificação de
fatos na rede de comunicação de computadores Internet
Nessa espécie o interessado solicita ao
tabelião que acesse um determinado website na Internet e
verifique um determinado conteúdo, narrando e
materializado tudo aquilo que presenciou. Ex: uso
indevido de imagens, textos, logomarcas, fatos contendo
difamações, injúrias etc.
3.
Objeto: verificação de fatos em diligência
Nessa espécie as situações são as mais
diversas e imprevisíveis, cito algumas como ilustração.
O interessado pode solicitar ao tabelião que se dirija
em diligência e verifique algum fato em determinada
parte da cidade, respeitando o tabelião, sua área de
competência territorial.
O interessado também
pode solicitar ao tabelião que presencie e verifique um
diálogo telefônico que o interessado fará a um
determinado número, de modo que o diálogo será
transcrito fielmente para o instrumento notarial. Outro
exemplo seria quando o interessado solicita ao tabelião
que constate a existência de placa publicitária
(outdoor) e transcreva seu conteúdo fielmente.
4. Objeto: autorização
para viajar
O interessado (pai ou mãe)
desejando autorizar o filho menor a viajar para qualquer
país ou estado do Brasil poderá solicitar uma ata
notarial, na qual será concedida a autorização,
mencionados os demais requisitos, em conformidade com o
previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente e na
correlata Lei Civil.
5.
Objeto: compromisso de manutenção
Nessa
ata o interessado declara que deseja promover a ida de
uma pessoa para o exterior, responsabilizando-se e
arcando com todos os custos de permanência da pessoa
naquele país e demais encargos. Da mesma forma, poderá
também promover a vinda para o Brasil de um visitante,
responsabilizando-se e arcando com todos os custos de
permanência da pessoa no Brasil.
6. Objeto:
verificação de sítio eletrônico e domínio na rede de
comunicação de computadores Internet
A
parceria entre Colégio Notarial do Brasil – Seção
Federal (associação de tabeliães de notas e protestos) e
a Digitrust (autoridade certificadora notarial)
possibilita identificar com fé pública os responsáveis
de sítios na rede de comunicação Internet. O usuário ao
navegar no sítio que contém o selo de site autêntico terá veracidade
de que aquele sítio é mesmo da instituição que se
apresenta. Quando o usuário clicar sobre o selo surgirá
uma página que se encontra nos servidores seguros da
Digitrust com informações do website. O selo de site autêntico pode ser
acessado em www.26notas.com.br.
7.
Objeto: comparecimento e ausência de outrem
Nessa espécie o interessado na qualidade
de compromissário-comprador em instrumento particular de
compromisso de compra e venda, já quitado, cujo
promitente-vendedor tenta impor embaraços ao cumprimento
da obrigação – ou seja, a outorga de escritura
definitiva – poderá notificar o promitente-vendedor a
comparecer em cartório, às tais horas, para fins de
outorga de escritura definitiva. Na eventualidade do não
comparecimento justificado, facultará ao
compromissário-comprador a solicitação de ata notarial
atestando a ausência do promitente-vendedor e a presença
do compromissário-comprador no cartório, no dia e hora
fixados na notificação. É um meio de prova para eventual
pedido de adjudicação.
8.
Objeto: nomeação de tutor
Nesse ato o
titular do poder familiar, desejando resguardar e
proteger o filho por ocasião de seu falecimento,
solicita ao tabelião que redija uma ata notarial, na
qual indica e determina que seu filho subsista na guarda
e tutela de “tal pessoa” de sua confiança. A nomeação de
tutor tanto pode ser por ata ou por escritura, decidimos
pela ata.
9. Objeto:
declaração de dependência econômica e de benefício
Nessa modalidade o interessado declara
que convive com determinada pessoa, e que esta é sua
dependente econômica e beneficiária de convênio médico,
pecúlio ect. Ex: utilizado para inclusão de convivente
(companheiro) no convênio médico do titular.
10.
Objeto: declaração de herdeiro legal
Essa
espécie de ata notarial é muito freqüente para atender
às exigências das empresas de seguro para pagamento de
indenização (DPVAT) por ocasião do falecimento do
segurado. O interessado declara que tem determinado grau
de parentesco com o de cujus e que este falece no estado
civil de solteiro, não deixando convivente, filhos,
testamento ect. Consideram-se interessados:
descendentes, convivente, ascendentes e colaterais.
11. Objeto: declaração de
estado civil e de ausência de impedimento para casamento
Muito freqüente para atender às
exigências dos consulados. Dois interessados solicitam
ao tabelião que desejam declarar e atestar que conhecem
determinada pessoa, bem como inexiste qualquer
impedimento legal que a iniba de contrair casamento.
12. Objeto: notoriedade
O interessado solicita ao tabelião que
verifique a existência e a capacidade de determinada
pessoa. Assim, o tabelião atestará que reconhece a
pessoa como a tal, e que a mesma aparenta boas condições
físicas e mentais, tendo ela declarado a ele, ora
tabelião, que não se encontra interdita ou em processo
para tanto, o que a capacita para todos os atos da vida
civil, conforme a correlata lei civil.
*Felipe Leonardo Rodrigues é
escrevente autorizado do 26º Tabelionato de Notas de São
Paulo, SP.
* Artigo
extraído do Boletim Eletrônico do IRIB nº 1178 de
01/07/2004